Os Primeiros Indícios:
Por volta de 1544, temos o primeiro indício que mostra o que Elizabeth pensava sobre sua mãe. Esta forte evidência vem a nós a partir da reunião de família em Whitehall. Em vários de seus livros, Weir mostra-nos provas referentes ao vínculo e importância que Elizabeth estava forjando em torno da memória de sua falecida mãe.
Por volta do ano de 1544, Henrique VIII teve uma brilhante ideia para propaganda. Ele encomendou um retrato representando seu núcleo familiar ideal e também reiterando seu Ato de Sucessão ( o retrato atualmente está exposto em Hampton Court). A jovem Elizabeth, na época com cerca de dez ou onze anos, é mostrada usando no pescoço um pingente em forma de um “A”. Pingentes com iniciais eram populares no período Tudor, e sabemos que Ana Bolena possuía pelo menos três pingentes de iniciais, um de ”A”, o famoso pingente de ”B” e outro que era uma junção dos dois formando um ”AB”, que ela usa no retrato de Nidd Hall (Weir, 187).
Elizabeth usou este pingente que havia pertencido à sua mãe, tempo o suficiente para ter sido associado à ela. Weir disse que o fato de Elizabeth ostentar publicamente sua ligação com sua mãe usando o pingente no retrato, não foi apenas um silencioso ato de desafio (que Henrique VIII deve ter escolhido ignorar, uma vez que ele aprovou o retrato), como também prova de que à esta altura, ela já devia ter ouvido o suficiente sobre sua mãe, a ponto de ter formado uma opinião própria a respeito. Isto significa que o édito real de nunca falar sobre Ana Bolena na presença de Elizabeth, estava sendo ignorado não por uma, mas por muitas pessoas e talvez naquela altura, Henrique VIII já tenha aceitado que sua filha já possuía opinião formada a respeito da inocência de sua mãe, e sendo tão teimosa como era, ele resolveu não perder tempo tentando mudar sua cabeça.
Já em meados de 1548, a jovem Elizabeth estava tornando-se uma ambiciosa pupila, graças à educação e atenção atribuída à ela por sua amorosa madrasta, a Rainha Catarina Parr. Como presente para sua madrasta, Elizabeth escolheu uma obra literária que pode ser outro indício de que ela sentia-se bem a respeito de sua mãe. A escolha de traduzir a obra de Margarida de Navarra ”O espelho da alma pecadora”, pode ter sido proposital, uma vez que Ana Bolena havia familiarizado-se com Margarida na época em que esta era conhecida como Margarida d’Angouleme.

Elizabeth e Maria Bolena:
Além de Elizabeth ter ouvido sobre sua mãe através fontes anteriormente citadas (Kat Champernowne-Ashley, Lady Bryan, Matthew Parker, Thomas Cranmer), seu tio por casamento, William Stafford, pode ter fornecido-lhe algumas informações. William Stafford casou-se Maria Bolena – tia materna de Elizabeth – por amor, e ainda residia da Corte nos anos em que ela teria ido visitar seu pai, Henrique VIII.
Embora as visitas iniciais de Elizabeth na Corte fossem escassas e distantes entre si, ela pode ter tido a oportunidade de interagir com seu tio, ou até mesmo mandar informações suas à Maria, através deste. Maria e Ana foram afastadas durante a queda desta, porém Maria, pode ter tido algumas boas lembranças que gostaria de compartilhar com Elizabeth através de seu marido ou de outros métodos clandestinos. Claro, isso é apenas conjectura, mas os últimos anos do relacionamento de Elizabeth com William Stafford e sua segunda esposa, Dorothy, sugerem um vínculo já estabelecido que, talvez, teve suas origens na infância (Weir discute detalhadamente este assunto em seu livro Mary Boleyn: The Mistress of Kings).
Elizabeth quase sofreu o destino de sua mãe:
Em 1554, quando Elizabeth possuía 20 anos, ela chegou bem perto de compartilhar o trágico destino de sua mãe. Podemos imaginar seu horror quando foi presa em Ashridge e encarcerada na torre por sua própria meio-irmã Maria I, durante três meses por suspeita de traição. Elizabeth, juntamente com suas quatro damas, foi presa nos alojamentos da Rainha.
Como prisioneira de nascimento Real, foram dados alguns privilégios à Elizabeth. Ela poderia fazer caminhadas supervisionadas, que tristemente levavam ao terreno onde era erguido o patíbulo para as execuções, ou seja, se ela quisesse sentir o ar fresco ou esticar as pernas, ela teria que passar várias pelo exato local onde sua mãe foi executada, e onde ela mesma, filha de Ana Bolena, poderia encontrar seu fim (Weir, 321).
Anos mais tarde, quando tornou-se Rainha, Elizabeth comentou com um nobre francês que, durante seu período de cárcere na Torre, ela achou que realmente fosse morrer e que não podia suportar a ideia de um carrasco cortar seu pescoço com um machado. Então, assim como sua mãe, ela havia decidido pedir um carrasco francês em seu lugar. Dessa forma, poderia morrer rapidamente (citado em Weir, pág. 321).

Elizabeth e seus primos Careys:
Enquanto Elizabeth pode não ter lembrado-se de sua tia e talvez, tido apenas breves encontros na infância com seu tio, ela desfrutou de uma especial proximidade com seus primos Carey. Catarina e Henrique Carey eram filhos de Maria Bolena. Apesar da paternidade incerta, eles eram seus primos em primeiro grau. O relacionamento deles foi outro brilhante exemplo de que Elizabeth sentiu-se bem a respeito de sua mãe e que não acreditava em sua culpa, pois caso acreditasse, jamais colocaria sua reputação em risco ao associar-se com parentes imediatos de uma mulher condenada adúltera e traidora.
Enquanto Rainha, Ana assegurou-se da tutela de seu sobrinho Henrique Carey, cuidando dele durante seu breve período como Rainha. Após sua queda, Henrique VIII continuou a fornecer ajuda para o jovem. Ressalto que isto nada tinha a ver com afeição ou até mesmo ao fato de que ele poderia ser um filho ilegítimo de Henrique VIII, e sim, pois era seu dever como Rei. Henrique VIII também forneceu ajuda à Catarina Carey, porém, de uma forma muito mais generosa e interessada. Weir diz em seu livro que, era provável que Catarina, e não seu irmão Henrique, fosse filha ilegítima do Rei com Maria Bolena, mas novamente, isto é mera especulação.
Elizabeth e seus primos Carey tiveram seu primeiro contato na infância, e podemos imaginar o quão feliz a jovem deve ter ficado quando finalmente relacionou-se com uma parte de sua vida que lhe fora proibida por tanto tempo. Ela provavelmente conheceu Henrique Carey, quando ele foi empregado de seu pai, ou possivelmente pouco tempo depois. Há algumas evidências de que Catarina Carey passou alguns anos na casa de Lady Elizabeth (Weir).
Os primos definitivamente conheceram-se em 1551, uma vez que as contas Reais de Lady Elizabeth em Hatfield House nos anos de 1551-1552, mostram que ela fez uma doação monetária para “o batismo do filho de Mr. Carey” (Weir, 259). Essa criança provavelmente foi Filadélfia Carey, mais tarde, esposa do Barão Thomas Scrope. Ele e sua irmã mais velha, Catarina Carey, tornariam-se as companhia favoritas de Elizabeth I (Weir, 259).
Apesar de um ou ambos os irmãos Carey poderem ter sido meio-irmãos da rainha Elizabeth I (ela certamente teria ouvido os rumores, e provavelmente teria formado sua própria opinião sobre o assunto), ela nunca fez qualquer menção a este fato, uma vez que este teria sido a prova do impedimento do casamento de sua mãe e seu pai. A própria Elizabeth foi declarada ilegítima em 1536, simplesmente pelo caso de seu pai com sua tia Maria Bolena (Weir, 259).
Irmãos ou não, a ligação entre Elizabeth, Henrique e Catarina foi excepcionalmente forte. Após tornar-se rainha, ela tratou ambos com muito menos formalidade que seus outros íntimos na corte, e muitas vezes riu e brincou com eles ruidosamente, especialmente no caso de seu atrevido primo Henrique.
As cartas de Elizabeth são um testemunho de seu vínculo. Em uma carta escrita em 1579, ela referiu-se a Henrique Carey como ”vosso primo de Hunsdon”. Ela também assinou cartas à Catarina como ”sua amorosa prima”.
Após sua adesão, em novembro de 1558, Elizabeth imediatamente começou a unir seus parentes maternos em torno dela no que pareceria uma ”família improvisada”. Henrique e Catarina Carey eram seus parentes de sangue mais próximos vivos, além das irmãs irmãs Grey, Margarida Douglass, Condessa de Lennox, e claro, Maria Stuart, Rainha dos Escoceses – com quem não tinha uma relação muito boa. Os irmãos Carey eram a única conexão direta de Elizabeth com sua mãe (Maria Bolena faleceu em 1543). E ao contrário da maioria das amizades e casos românticos de Elizabeth I, seus devotos primos Carey nunca vacilaram. Elizabeth nunca teve de questionar sua integridade ou lealdade, e encontrou um grande alívio, ou talvez até mesmo um sentimento de fiabilidade por isso.
Além das muitas homenagens que Henrique Carey ganhou enquanto Elizabeth foi Rainha, ele foi nomeado ”Primeiro Barão Hunsdon”. Como Tenente-General do Norte, Hunsdon sofreu uma das mais graves ameaças do reinado de Elizabeth: a Rebelião do Norte, de 1569-1570. Quando o exército rebelde foi derrotado, com Hunsdon conduzindo Leonard Dacre de volta ao longo da fronteira, Elizabeth acrescentou uma nota personalizada junto a carta de felicitações enviada pelo estado, dizendo:
“Eu duvido muito meu Harry, se aquela vitória foi a que deu-me mais alegria, ou que foi Deus que designou o instrumento de minha glória, e garanto-vos que, para o bem de meu país, o primeiro pode ter sido suficiente, mas para o contentamento do meu coração, o segundo agradou-me muito mais. Tua amorosa parente, Elizabeth R.” (Arquivo Nacional)
Além de sufocar a rebelião do Norte, Henrique Carey, ou Barão Hunsdon, foi parte de todos os principais acontecimentos políticos e militares do reinado da rainha Elizabeth, e o principal, ele foi um comissário da Rainha no julgamento escoceses, e mandou uma força de mais de 30.000 pessoas à Tilbury Fort em 1588, onde a rainha havia o enviado “para a defesa e segurança de nossa pessoa Real.”
Ainda assim, a Rainha Elizabeth não foi uma sicofanta para com seus antecessores; ela elogiava quem assim merecia. Uma das únicas vezes que manteve seu primo Hundson em cheque, foi por nunca conceder-lhe seus títulos hereditários, como Conde de Ormond e de Wiltshire. Hunsdon reivindicou estes títulos através de seu avô comum, Thomas Bolena (Weir, 262).
Enquanto Henrique Carey foi uma figura de destaque na vida pública e política da rainha Elizabeth, sua irmã Catarina Carey ou Lady Knollys, aproveitou o lado privado do relacionamento com sua prima. Este foi um privilégio atribuído para poucos. Catarina e Elizabeth, já eram muito próximas desde a época em que Maria Tudor ocupou o trono. Catarina e seu marido Francis Knollys, um homem cujas convicções religiosas, mais tarde o levariam a tornar-se um defensor no parlamento para o movimento puritano, sentiram durante o reinado de Maria I, que era melhor fugirem para o exterior com seus filhos, ao invés de correrem o risco de perseguição.
Elizabeth lamentou separar-se de sua querida prima, assinando em sua carta de despedida “cor rotto”, ou “coração partido”. (Weir, 270) Elizabeth deve ter experimentado um grande medo e tristeza, e talvez sentindo-se traída, já que a maioria das pessoas em que confiava, saíram do país. No período de Maria I, Elizabeth como irmã da rainha, foi cuidadosamente monitorada e nunca poderia ter escapado sozinha, mesmo que quisesse. Elizabeth pode ter imaginado que se os conflitos do reinado de sua irmã continuassem, ela nunca mais veria seus amigos e família novamente.
Após a adesão de Elizabeth I, Catarina retornou à Inglaterra tornando-se Dama da câmara privada e seu marido conselheiro privado e vice-camareiro da casa da rainha, assim como governador de Portsmouth.
O embaixador francês Fenelon, observou que a rainha Elizabeth “amava Lady Knollys acima de todas as outras mulheres do mundo.”. Além de ter o sangue Bolena / Howard correndo em suas veias, Elizabeth certamente sentiu-se atraída pela personalidade de Catarina; diziam que ela foi agraciada com “inteligência, bons conselhos” e “uma mente tão limpa e desprovida de malícia.”
Após a morte da governanta e figura materna da infância de Elizabeth, Katherine Champernowne-Astley em 1595, Catarina Carey-Knollys a sucedeu como dama-chefe do quarto Real.
A devoção de Catarina para com a Rainha e seus deveres como esposa e mãe, muitas vezes entravam em desacordo. Elizabeth não podia suportava dividi-la com seu primo durante uma parte substancial de tempo, e Francis era tão ligado à sua esposa quanto a Rainha. Elizabeth muitas vezes recusou os pedidos de Catarina e Francis de visitar um ao outro.
No final, foi Elizabeth quem estava com Catarina quando ela morreu em 1569, no Palácio de Hampton Court. Seu marido Francis estava em uma viagem de negócios do estado. Ambos sofreram e choraram a morte de Catarina com a mesma intensidade. Knollys disse, “meu caso é lamentável” e salientou que estava “distraído pela tristeza.” A Rainha Elizabeth assistiu ao funeral de sua prima e financiou os devidos trâmites de enterro, pagando mais nele do que qualquer outro que ela financiou ou viria a financiar em sua vida – a soma total do sepultamento, velório, enterro e tumba, alcançaram o admirável equivalente moderno de £111.300!
Mesmo que a pompa do serviço funerário tenha sido generosa, houve uma disputa entre o clero da Abadia de Westminster e o Colégio de Armas, sobre onde esta ficaria.
CONTINUA NA PARTE III – FINAL.
FONTES:
BEING BESS: AQUI.