Com sua esposa Ana Bolena, na Torre, Henrique VIII considerou todos os detalhes de sua morte próxima, meditando sobre seus planos para o cadafalso. A maneira como ele fez isto, tornou-se uma decisão única. Ana, foi a única entre as vítimas Tudor, a ser decapitada com uma espada e não o tradicional machado. A pergunta que é até hoje feita e permanece sem resposta é – por quê?
Os historiadores têm sugerido, que Henrique escolhera a espada, pois Ana havia passado algum tempo na França, onde a nobreza era executada desta maneira; ou porque oferecia-lhe uma morte mais digna. Porém, Henrique não importava-se com os sentimentos de Ana, a seus olhos, ela era uma traidora do reino, não merecia misericórdia. Dizem que Ana, prestes a ser decapitada, na manhã de 18 de Maio, ficou esperando até o meio dia, para ser informada que morreria no dia seguinte. Na raiz da decisão de Henrique, ele não pensou em Ana e sim, nele mesmo…
Quando Henrique VIII apaixonou-se pela jovem Ana de cabelos negros em 1526, ele representava um ideal de realeza e cavalheirismo que ganhou vida: era bonito, piedoso e marcial. Na Europa diziam, “sua grande fama e nobreza”, eram “maiores do que qualquer príncipe desde o Rei Arthur”. Não poderia ter sido maior elogio para Henrique: Le Morte d’Arthur de Thomas Malory, foi tecida em mitos familiares Tudor. O primeiro rei Tudor, Henrique VII, havia reivindicado a linhagem galesa dos Tudors, fazendo deles, herdeiros de Rei Arthur. Ele até deu o nome ao seu filho mais velho. Somente quando o menino morreu, pouco após ter desposado a jovem arruivada Catarina de Aragão, que Henrique perdeu seu entusiasmo para os mitos arturianos. Já Henrique VIII, iria voltar-se para eles.
Em 1516, Henrique VIII teve uma mesa redonda, que ainda paira no Grande Salão do Castelo de Winchester e que acreditava-se remontar à antiga Camelot, pintada com a figura de Arthur, só que com as características de Henrique, sob uma coroa imperial. Era a crença de Henrique, que a Inglaterra era historicamente um Império e ele, o herdeiro de Arthur. Isto mais tarde, tornou-se a base para sua pretensão de um Império – comando – sobre a igreja, bem como do estado. E logo após a ruptura com Roma e o Papa, ele desposou Ana, em 1533.
Mas, assim como Catarina de Aragão, Ana falhou em dar a Henrique, o filho que ele tanto desejou, e quando ela abortou em Janeiro de 1536, ele perdeu as esperanças de que ela o faria. Ele começou a reclamar que Ana havia o seduzido para casar-se com ela — uma acusação que carregava certa sugestão à bruxaria (embora ela nunca fosse formalmente acusada de tal) — e ele passou a mostrar um crescente interesse em sua dama de companhia, Jane Seymour.
Dissolver o casamento com Ana, fora uma complexa questão para Henrique, que temia que isto novamente confirmasse, ”a autoridade papal” sobre a Inglaterra. Ana também, fez de Thomas Cromwell, seu ministro chefe, um inimigo com quem ela discutiu sobre a questão do que fazer com o dinheiro da dissolução dos monastérios. Ana esperava que o dinheiro fosse para instituições de caridade, enquanto Cromwell pretendia colocá-lo nos bolsos do Rei. Porém Ana não possuía alçada o suficiente para decidir tais meios, mas ela tentaria…
Em 2 de abril, o capelão que seria encarregado das doações de caridade de Ana, fez um sermão na corte, que sugeriu uma comparação entre Cromwell e um personagem da Bíblia chamado Hamã, o ministro corrupto de um rei do Antigo Testamento. O sermão observou ameaçadoramente, que Hamã morreu no cadafalso. A raiva de Ana com Henrique também fora evidente durante estas semanas. Seu irmão, George, deixara escapar que ela havia queixado-se de que Henrique não possuía “nem talento ou vigor” na cama. Alguns perguntaram-se se ela tinha um amante, visão incentivada por suas flertes as vezes ultrajantes – e foi isto que provocou sua queda.
No sábado, dia 28 de abril, quando o servo do Rei, Sir Henry Norris chegou à sua Casa Real, Ana perguntou por que ele ainda não havia casado-se com a dama de companhia que ele andava visitando. Quando Norris deu de ombros, dizendo que ”demoraria um tempo”, Ana brincou: “Você deseja a morte do Rei para beneficiar-se, mas você deveria desejar a mim”. Imaginar a morte do Rei, era um delito de traição e Norris horrorizado respondeu, que “se ele devesse ter tal tipo de pensamento, ele teria (e desejaria ter) sua cabeça arrancada.
No dia seguinte, um jovem músico da corte chamado Mark Smeaton, que havia sido visto deprimido por Ana logo cedo no sábado, foi secretamente levado para a casa de Cromwell para ser interrogado. A conversa de Ana com Norris, deu a Cromwell, um meio de acusá-la de traição. Mas era improvável que Norris confessasse adultério e consequentemente, tornar a acusação de tramar o assassinato do Rei, plausível. Seria necessário um homem mais fraco para manchar a castidade de Ana – e Smeaton preencheu este papel. Antes daquela noite, Henrique soube que Smeaton confessara o adultério com a rainha. Ele adiou, mas não cancelou, uma viagem que havia planejado para levar Ana para Calais em Junho. Ele não podia saber o que mais Cromwell iria descobrir. Na manhã seguinte, um dia de Maio de 1536, ele participou de um torneio com Ana no Palácio de Greenwich. À medida que o torneio terminou, uma mensagem foi passada para o rei. De repente, ele levantou-se de seu assento e partiu para Westminster à cavalo, tomando um punhado de atendentes. Norris foi chamado para juntar-se a ele, enquanto uma Ana atônita, foi deixada para supervisionar o encerramento do torneio.
Como a comitiva do Rei saiu, Henrique perguntou a Norris, se ele havia comitido adultério com a Rainha, oferecendo-lhe perdão, caso ele confessasse. Norris, um membro da Ordem da Jarreteira, o equivalente Tudor a um cavaleiro da távola redonda, viu-se no papel de Lancelot e Ana no de Guinevere. Ele desesperadamente alegou sua inocência. Isto não fez bem a ele. Norris então, juntou-se a companhia de Smeaton na Torre aquela noite. Ana foi levada embora no dia seguinte, juntamente com seu irmão, acusado de adultério com sua irmã. Dois outros cortesãos seriam condenados no julgamento de tramar a morte de Henrique com a Rainha.
Como as inadequações sexuais de Henrique foram mostradas durante os julgamentos, ele respondeu protegendo sua virilidade, alegando que ficara fora todas as horas, banqueteando-se com lindas damas. Em privado porém, ele consolou-se de modo diferente, obcecado com todos os detalhes da morte de Ana. Em Le Morte d’Arthur de Malory, Guinevere fora sentenciada à morte pela fogueira. Henrique decidiu que Ana seria decapitada com uma espada — o símbolo de Camelot, da masculinidade e de um Rei por direito. Historiadores argumentam se Ana realmente fora culpada de adultério ou se Henrique e Cromwell foram os responsáveis por sua queda. Porém, a escolha de uma espada para matar Ana, reflete um certo fato: um vaidoso Henrique procurando ser vingado.
‘Eu ouvi dizer que o carrasco é muito bom e eu tenho um pescoço fino’ – disse Ana uma dia antes de sua execução e rindo, ela colocou suas mãos em volta de sua garganta. Pelo menos, fora uma morte rápida: sua cabeça caiu de seu corpo como um sopro, seus olhos e lábios ainda moviam-se quando sua cabeça caiu sob a palha.
FONTES:
Leanda de Lisle: AQUI.