Segundo o embaixador imperial, Eustace Chapuys, no dia 29 de Janeiro de 1536, Ana Bolena abortou um herdeiro varão, com aproximadamente três meses e meio de gestação. O aborto de Ana, fora um profundo golpe, tanto para ela, quanto para seu marido, o rei. Em todo modo, não está claro, qual o impacto desta perda no relacionamento do casal, assim como na queda de Ana. O historiador J.E. Neale, aponta que Ana ”abortara seu salvador” e Retha Warnicke, escreve que ”sua queda, fora quase certamente desencadeada, em natureza do aborto que sofrera no final de janeiro, embora não haja evidências de que ela estivesse em algum perigo pessoal, ou político”. No entanto, Eric Ives, um dos mais famosos estudiosos sobre sua vida, discorda:
“O aborto de 29 de Janeiro, não fora nem a última chance de Ana e nem o ponto em que Jane Seymour substituiu-a nas prioridades de Henrique. Ele no entanto, tornou-a novamente vulnerável.”
Ao que tudo indica, ela estava de fato vulnerável, mas não havia alcançado ainda, o início de sua queda, ao contrário do que muitos especulam.
A fim de obtermos uma ideia sobre o impacto deste aborto na queda de Ana Bolena, apenas três meses depois, devemos analisar seu histórico obstétrico, afinal, se Ana houvesse tido uma série de abortos, então Henrique poderia muito bem, ter decretado sua queda em Janeiro de 1536 e acreditar que este seu segundo matrimônio, fora tão amaldiçoado, quanto o primeiro (segundo suas convicções, claro). O problema, é que não temos qualquer registro médico de Ana Bolena e os historiadores, parecem ter ideias diferentes e bastante particulares sobre as consequências pessoais que seus abortos lhe trouxeram. O historiador G. R. Elton, escreveu sobre um ”sombrio conto de abortos”, Mary Louise Bruce escreveu que ”durante os primeiros seis meses de 1534, ela parece ter tido, um aborto após o outro” e Hester Chapman, escreveu sobre três abortos em 1534, enquanto F. Chamberlin escreveu apenas sobre dois abortos, um em 1534 e outro em 1535. Vamos então, tentar encontrar um equilíbrio, dentro deste emaranhado de opiniões controversas.
Ano de 1533 – 7 de Setembro: Ana Bolena deu à luz a uma pequena garotinha, que seria a futura Rainha Elizabeth I da Inglaterra. Ela engravidou, pouco tempo depois de seu retorno da França, em novembro de 1532.
Ano de 1534 – 28 de Janeiro: Um envio de Chapuys para Carlos V, menciona Ana ficar grávida e tal afirmação, é apoiada por uma carta de George Taylor para Lady Lisle, datada do dia 7 de Abril, na qual Taylor escreve ”a rainha está com uma bela barriga, rezando ao nosso senhor, para enviar-nos um príncipe.” Em Julho deste mesmo ano, George, Lord Rochford, foi enviado à França a fim de pedir um adiamento de um encontro entre Henrique VIII e Francis I, devido ao fato de Ana ”estar em estado tão avançado de gravidez, que não poderia cruzar o mar com o Rei.” Existe também, outra menção da gravidez de Ana, em uma carta de Chapuys, datada de 27 de Julho. Eric Ives, também aponta sobre como Henrique VIII encomendou um berço de prata, decorado com pedras preciosas e rosas Tudor, de seu ourives, Cornelius Hayes, em Abril de 1534 e não teria gastado tal quantia em tal berço, se não tivesse certeza de que Ana estivesse de fato, grávida.
Não sabemos o que aconteceu com esta gravidez. Não existem registros de um natimorto ou aborto, então talvez, esta tenha sido uma gravidez psicossomática, causada pelo estresse e responsabilidade em gerar um herdeiro ao trono. Uma gravidez psicossomática, também conhecida como pseudociese, afetava mulheres, que geralmente desejavam muito engravidar e por algum motivo específico, não conseguiam. Ela chega a parecer com uma gravidez comum em estágio inicial, podendo fazer com que a mulher apresente os típicos sintomas de uma gestação, como por exemplo: enjôos, desejos, crescimentos dos seios e barriga, ausência da menstruação e às vezes, até produção de leite materno. Sendo perfeitamente possível que tenha sido identificada como uma simples e tão desejada gravidez.
O próprio Chapuys sugeriu em uma carta datada de 27 de Setembro de 1534, que poderia tratar-se de uma falsa gravidez: ”Desde que o Rei passou a duvidar de que sua dama estava de fato grávida ou não, ele renovou e aumentou o amor que já possuía por uma linda dama da Corte.” Em todo modo, Ives não acredita na teoria da falsa gravidez e aponta que Ana não estava sob qualquer pressão indevida na época, tendo dado ao rei, uma menina, juntamente da esperança de que poderia facilmente conceber novamente. Ele acredita que ela abortou, já que não houve qualquer registro de Ana ter sido levada às suas câmaras, de modo a excluir um natimorto.
Ano de 1535 – 24 de Junho: Sir William Kingston escreve para Lord Lisle dizendo ”Vossa Graça tem uma boa barriga, como eu já vira antes”, mas não temos nenhuma evidência corroborando e Sir John Dewhurst, que examina as gravidezes de Ana Bolena e Catarina de Aragão, especula se a data desta carta, poderia de fato ser de 1533 ou 1534, já que também fala de um homem que morreu em Outubro de 1534. Esta poderia simplesmente, ser mais uma evidência, corroborando para sua gravidez em 1534.
Ano de 1536 – 10 de Fevereiro: Uma carta de Chapuys, para Carlos V, fala sobre o aborto de Ana Bolena, no dia do funeral de Catarina de Aragão, em 29 de Janeiro de 1536.
Finalizando, após tais constatações, apenas temos provas de 3 gestações. Sendo elas, a primeira de Elizabeth, uma menina saudável e duas outras, resultando em abortos espontâneos. Na realidade, a gravidez ocorrida no ano de 1534, pode muito bem ter tratado-se de uma gestação psicossomática, devido a todos os sintomas apresentados e o fato de que mesmo sem muita pressão exercida sobre a função na qual ocupava, era claro que Ana tinha noção do que ela representava no momento e do quanto suas gravidezes, eram importantes para o reino – assim como qualquer rainha anterior ou posterior à ela. As opiniões de historiadores, mesmo que algumas vezes bastante divergentes, não deixam – na maioria das vezes – de serem compreensíveis. Ana mostrou que podia conceber, o que é um grande alívio, mas também abortou, algo que gera preocupações, portanto é natural que tal divergência ocorresse entre eles.
Ao decorrer destas gravidezes falidas, pode ter sido natural que Henrique vislumbrasse em Ana, o passado com Catarina e seus herdeiros ”privados por Deus”; questionando-se se ao final de contas, a história não repetiria-se novamente. Em todo modo, não há razões para acreditar, que seu aborto em 1536, houvesse sido o fato crucial para sua queda.
FONTES:
On the Tudor Trail: AQUI.