O episódio começa com um Thomas More, longe de ser o outrora adorado humanista pelos filósofos e rei; neste episódio vemos seu lado mais sombrio – o de perseguidor. Logo após o vislumbre cru dos últimos anos de More, onde ele separou-se visivelmente de seu lado pensador dos tempos de ”A Utopia”; seguimos para o mito, a visão típica que filmes e séries fazem-nos engolir da princesa Maria, filha de Henrique e Catarina. A jovem Maria aparece como um ser adoentado, frágil, insípido, que não “suporta as condições femininas”. A ideia de que Maria fora sempre doente, é uma construção. Vocês nunca se perguntaram porque os únicos filhos de Henrique VIII que aparecem como doentes desde a infância, são Maria e Eduardo, e nunca Elizabeth!? A resposta é simples meus caros: MITO – PROPAGANDA – POLÍTICA – CONSTRUÇÃO DE IMAGEM – TV/SÉRIES. Agora assistam novamente todas as produções sobre os filhos de Henrique VIII e pesem o que dissemos. Isto é muito importante, portanto lembrem-se sempre destes fatores.
Nesta cena, Cromwell tem a indigesta missão de avisar a Rainha Catarina, de que ela esta partindo da corte – um eufemismo oportuno para “banida da corte pelo rei”. Isto lembrou-me aquelas conversas com diretores escolares, onde eles diplomaticamente “convidam o aluno a se retirar” o que significa uma expulsão. Eufemismo, eufemismo e eufemismo…a Corte sobrevivia disto. Um detalhe interessante, é que Catarina raramente aparece na série, mas quando aparece, está em sua pose de rainha digna e vestindo purpura, como uma princesa de alto nascimento faria.
Algumas cenas depois, uma Ana surtando porque um arco resolve “não funcionar” mostra a sutileza da corte. Enquanto Cromwell observa, todos tentam ajudá-la – sabem aqueles favores e agrados que fazemos aos poderosos? Este momento marca a transição; Ana passa a ser poderosa. Em seguida começam a confabular, ela e Cromwell. Esta cena é incrível por dois aspectos, Ana tem duas falas que fazem sentido com o seu futuro. A primeira delas é sobre o amigo advogado de Cromwell, que foi preso por More. Ao pedir para a dama do rei interceder por ele, Ana o diz: “ As pessoas deviam dizer o que for mantê-las vivas”, já que a série é sob o ponto de vista de Cromwell, certamente esta fala tem um peso para o desfecho trágico de Ana Bolena. A segunda fala é ainda mais contundente, Ana debocha de Jane Seymour e o escândalo envolvendo seu pai, cunhada e irmão. Ana diz a Cromwell: “ninguém vai querer casar com ela agora” , ledo engano, Ana…ledo engano…
Uma cena perfeita e poderosa, é o confronto entre Thomas Cromwell e Thomas More. Lembram-se da Guerra Fria? Este sentimento sempre retorna para nós. O ponto alto da discussão: Quando More diz que torturaria, queimaria e faria o que fosse preciso, para salvar a alma de alguém. Uma questão interessante levantada e que nos faz refletir os perigos da religião…
O episódio corre em 58 minutos e cheio de acontecimentos. Um dos arcos é Henry Percy, dizendo-se casado com Ana Bolena. Em reunião de família na Câmara de Ana, Cromwell é chamado para “resolver” a bagunça, que um dia já fora resolvida por seu mestre e guia, Wolsey. Em meio à ameaças metafóricas e uma aula de economia, Cromwell mostra serviço e faz com que um tolo e assustado Percy, acabe recuando…
Um fator torna-se certo, Cromwell está no meio de tudo, isto porque aos poucos, ele torna-se tudo. Ele começa sua ascensão aos poucos e vai ganhando espaço, especialmente entre aqueles que o desdenham. Enquanto isto, tem de observar seus amigos protestantes sendo torturados, sua cunhada -com quem se envolve- terminando o que eles possuem, junto de sua vingança pessoal contra aqueles que derrubaram Wolsey.
Na cena da demissão de More, tenho a impressão de ser Henrique VIII, e poder sentir o que ele sentia quando olhava para Ana. Sim, a Ana de Claire Foy é bela (o que Ana não fora considerada), é pálida demais, tem olhos azulados, mas ela também tem magnetismo. É impossível olhar para ela e não se encantar com algo, não com a face, com a cor dos olhos, com a voz, com a mente, com a personalidade. A energia dela é magnética.
Outra cena icônica é o desfile da corte para a Igreja, a população toda grita, empolgada (confesso que achei estranho, já que Ana era detestada pelos comuns), até que a Donzela de Kent aparece profetizando tragédias para Henrique, que além de ignorá-las, debocha da menina. Ana e seu tio, Norfolk, ameaçam a garota, o que leva a população a urrar e vaiar a corte. Tudo isso em questão de minutos.
A coroação de Ana é incrível, poderosa. Tudo nela é magnifico. Faz com que tenhamos a impressão de ter feito parte deste verdadeiro evento. Quase sentimos empatia dela; não a fria e maquinadora e sim a mulher e cortesã, que ascendeu tão alto. Quando acaba a cerimônia, Ana retorna para seus aposentos na Torre de Londres, e é visitada por Cromwell. Lá, ela acredita que a população gritava por ela, neste momento sua cunhada, Jane Bolena – e sua língua ferina – debocha da nova rainha, dizendo que ela jamais será tão amada quanto Catarina, pois Catarina é filha de reis ungidos. Ana aparenta sentir desconfiança e quem manda Jane Bolena parar, é ninguém mais, ninguém menos, que Jane Seymour. É irônico, pois ninguém acredita no potencial de Jane Seymour, apenas ela mesma e…Cromwell. Jane sofre com os deboches de Ana, de seu próprio irmão, mas ela está naquele jogo e sabe jogá-lo muito bem, é uma sobrevivente. Comer pelas beiradas, este deveria ser o lema da esperta Jane Seymour…
CONTINUA no episódio #4.
Gostei muito da tal aula de economia dada pelo Cromwell e sobre a forma como ele descreve o poder do dinheiro. Nesse aspecto a humanidade não mudou nada.
Obs: só um detalhe. Estou assistindo via Netflix e estou notando algumas diferenças entre o que está descrito no post. É como se algumas cenas, não estivessem no episódio 3, mas sim no 4… notei o mesmo no posto do segundo episódio.
Adiantamos algumas cenas sim, como a morte de Wolsey ou o carteado de Ana, pois seriam cenas que precisaríamos abordar melhor no capítulo seguinte, fazendo um análise e reflexão, e como falamos no final de um resumo e ela ocorre no ínicio do próximo, foi uma tentativa de preparar o leitor para a análise. 🙂
Ah! Agora tudo fez sentido! Rsrs bom saber que não estou ficando louco…
Não está ficando não!heheheh… Alguns assuntos servem apenas como ligação para outros – como a morte de Wolsey. Todos sabemos que ele morre, mas a circunstância que nos é entregue, que é digna de menção. Enfim… Vou tentar deixar os eventos menos misturados nas próximas. 🙂