A Acne no Período Tudor (e Depois)

maquiagemperiodotudor1A acne é um dos problemas de pele mais comuns da atualidade, afetando todos os grupos etários e raças. Geralmente afeta o rosto, porém, pode aparecer em vários outros locais do corpo humano, como tórax, costas e braços. Ela é caracterizada por pústulas avermelhadas, fechadas ou abertas, podendo ser afetada pelo humor, hormônios, genética e alimentação. Mas a pergunta que paira no ar é: – Este é um problema recente? As pessoas do passado também sofriam com isto?

Às vezes, tendemos a pensar na acne, como um fenômeno moderno. Porém, ela estava desde os tempos mais remotos. As civilizações antigas, já falavam sobre ela – inclusive apontando maneiras de trata-la. A acne sempre despertou grande curiosidade entre estudiosos, porém, muitas histórias, mitos e crenças supersticiosas sempre estiveram relacionadas à sua causa, muito mais que a medicina tradicional.

Introdução Histórica:
A história da acne, tem sido rastreada através do tempo, desde as antigas civilizações, como os egípcios, gregos e romanos. Alguns registros históricos egípcios, mostram-nos que até os faraós sofriam disto, e não mediam esforços para resolvê-84046e340808fb7aa07ba1c52a6562d5lo.Traços de um óleo essencial usado no tratamento de cicatrizes de acne, foram encontrados na tumba de Tutancâmon.

Existem inúmeros livros de receitas, ensinando unguentos e remédios caseiros para o tratamento da acne. No papiro em Ebers, encontramos a palavra “aku-t”, mais tarde traduzida como furúnculos, pústulas, feridas, ou qualquer inchaço inflamatório, e é descrita como sendo tratada com uma mistura de mel.

Já na Grécia, a primeira menção conhecida à acne, apareceu nos escritos antigos em grego, do médico bizantino Aécio Amidenus. A palavra ‘acne’, parece ter evoluído da palavra de origem grega ‘Acme’, que significa “mancha ou marca”.

A partir de registros históricos, sabemos também, que tanto Hipócrates, quanto o grande filósofo Aristóteles, estavam cientes desta doença. Aristóteles explicaria em detalhes tal condição. Os gregos antigos, conheciam a acne como ‘Tovoot’. Esta palavra estaria associada a expressão, “o primeiro crescimento da barba”, sendo portanto, associada com a puberdade. Um compilador grego do período bizantino, Paulus Aegineta, recomendava para a cura, uma mistura à base de sabão e mel.

Já na Roma antiga, a acne era tratada com banhos. As pessoas acreditavam que a pele poderia ser limpa, renovada e curada, com uma mistura de enxofre nas águas. Em 3 a.c, Cássius interpretaria que a acne, estava relacionada à um distúrbio da puberdade.


No Período Tudor:
Uma das principais causas da acne no período Tudor, foi o uso da maquiagem. O uso de maquiagem mais pesada, não era moda durante o início e meio do reinado Tudor, como por ex, o reinado de Henrique VIII. Durante as Cruzadas, a Europa foi captura-de-tela-2014-10-11-c3a0s-06-21-21introduzida aos produtos cosméticos utilizados no Oriente Médio. A maquiagem desenvolvida por lá, passou a ser utilizada pelos antigos egípcios por volta de 3000 a.c.

Durante o reinado de Elizabeth I, fora dada uma primordial importância à aparência das mulheres. Uma pele extremamente pálida, indicaria status e portanto, as mulheres começariam a usar o famoso (e já citado aqui) ceruse veneziano; uma pasta à base de chumbo, extremamente venenosa, que conferiria à mulher, uma tez branca de alabastro. É claro que esta cobertura pesada na pele, proporcionaria um terreno fértil ao desenvolvimento de acnes e problemas de pele.

Podemos notar isto, nas seguintes descrições:

A camada de ceruse era tão grossa, que um satirista elizabetano, comentou que: ”um artista não precisaria de caixas de tinta para seu trabalho, e sim, apenas uma senhora elegantemente pintada, em pé nas proximidades para que pudesse usar seus pigmentos”.

Para muitas pessoas do período, o efeito do ceruse na pele das pessoas, era o de uma medonha máscara, como se suas makeup2faces tivessem sido revestidas por gesso. Muitas mulheres que usavam, ao invés de limparem o rosto para depois aplicarem uma nova camada, dormiam com elas e depois, apenas acrescentavam outra camada acima da anterior.

O padre jesuíta Anthony Rivers, relatou no natal de 1600, que Elizabeth I, ”havia sido pintada em alguns lugares, com quase meia espessura de ceruse”. (Foley, Records of the Soc. of Jesus,ii; and Nashe in the 1594).

Com tantas camadas e camadas de maquiagem, a acne no período Tudor, assim como muitos outros no passado, era um problema que levava as pessoas à recorrerem à curas caseiras, muitas vezes, erroneamente confundidas com feitiçaria. Mesmo assim, durante o século XVI, as pessoas não tinham apenas cicatrizes de acne, como também tinham de enfrentar outras cicatrizes, como a de varíola, e inúmeras outras epidemias e surtos. Com tantos problemas de pele, o tratamento mais popular contra cicatrizes e acne do período, foi o mercúrio. Segundo consta em documentos do período, ele era eficaz em remover manchas escuras, rugas, cicatrizes e outras imperfeições. O mercúrio, como sabemos, é altamente danoso à pele, chegando a corroer o tecido. O tratamento causava um ciclo vicioso, fazendo que o usuário, com a falta de resultados, apelasse cada vez mais para o ‘’remédio’’ ou maquiagem. Após o período Tudor, Riolanus Jonston, associou a acne com distúrbios da menstruação em 1638 e 1648, respectivamente. Em 1648, Jonston relacionou a acne ao comportamento heterossexual, juntamente com ideias psicossomáticas sobre o assunto. Ele também citou que, elas ‘’são minúsculos tumores duros na pele do rosto, coalhado de um espesso disco de liquido”.

Tratamentos Tudor:
Existiam alguns tratamentos bastante inusitados para tentar burlar o efeito da acne no rosto e corpo. Deixaremos aqui algumas 7b6f0710230a76f4d5f07acfc8630949receitas de período Tudor (e outras de outros períodos), ensinando como lidar com este problema. Lembramos que elas estão aqui, apenas para curiosidade científica e não nos responsabilizamos se alguém quiser fazer isto em casa.

O alquimista e médico alemão, Daniel Sennert (1572-1637), citou os conceitos de Theocritus e Rhodiginus, para lidar com a acne e até mesmo rosácea. Em 1609 Hugh Plat escreveu um livro intitulado ‘Deleites para senhoras’ que continham uma série de tratamentos para problemas na pele. Por exemplo:

Para ajudar com vermelhidão ou espinhas:
Dissolver sal comum no suco de limões, e em um pano, passar no paciente com marcas ou espinhas. Isto curará com alguns curativos.

Para tirar espinhas e sardas das mãos e rosto:
A receita era obtida à partir da árvore de bétula, muito abundante em março ou abril. Prepare um refratário de areia de vidro para colocar a seiva da folha de bétula, e use-a no rosto, ou partes desejadas. Isto deixará sua pele a mais excelente e muito clara. Esta seiva vai dissolver a espinha, um segredo não conhecido por muitos. Poderia ser adicionado enxofre. Coloque a mistura na face e remova de manhã.

Outras curas;

Urina: Ela foi utilizada como cura da acne e limpeza da pele, até pelo menos, o século XVII. A Enciclopédia de Medicina honeypopular, relata que “esfregar o rosto do bebê com uma fralda recentemente molhada”, era uma pratica comum na Escócia, a fim de evitar a acne no futuro, dando uma boa aparência a criança. Em um artigo sobre remédios naturais, uma mulher de setenta anos é citada afirmando que: “Nenhuma das meninas na família já teve acne. Todas possuíam pele fina até o final da vida. Minha mãe tinha a pele rosada de bebê até o dia de sua morte, e apenas banhou seu rosto em urina, em algumas ocasiões nos últimos anos.” Era sugerido também, que a pessoa usasse “a sua primeira urina do dia’‘ em um pano branco, e passasse em torno da acne. Ou: ”se há um bebê por perto, use sua fralda molhada. Isto teria de ser feito diariamente”.

Enxofre: Uma mistura de enxofre e melaço, é uma cura histórica que tinha sucesso, sendo ligeiramente mais moderna que a urina. O melaço também era usado para curar ansiedade, constipação, anemia, artrite e câncer.

Mel: Em um livro de receitas de remédios caseiros, era indicado uma mistura de noz-moscada, pimenta preta e sândalo; mel, também usado pelos antigos egípcios.

Abstinência: Algumas pessoas curavam a acne com abstinência sexual de até duas semanas.

Outras formas de tratamento, também envolviam leite, vinho tinto e água da chuva.

Manchas de Beleza:
O uso do ceruse no período Tudor, seria o responsável pelo surgimento das posteriores manchas da moda”, que nada mais eram, que remendos de veludo ou seda escuro, colados acima das cicatrizes causadas por seu uso.

55696df5689952064cc212077e023fa2“Nossas senhoras ultimamente, têm entretido-se com o vão costume de colocar manchas, como pintas ou verrugas, para realçarem suas belezas, como Vênus. As manchas negras, devem tornar seus rostos notáveis; algumas enchiam-se delas, variando com todos os tipos e formas de figuras”. – John Bulwer, 1653.

Estes remendos, podiam ser cortados em vários formatos, de modo a não ser apenas colocado sobre manchas na pele para escondê-las, como também para embelezar a mulher. Seus formatos eram variados, tais como estrelas, corações, diamantes e luas crescentes. Eles eram usados por homens e mulheres, no rosto e corpo. Existia até uma simbologia sobre o melhor local para o uso destas manchas, com base no modo em que eram posicionados. Se fosse colocado perto da boca, isto significava que a pessoa estaria flertando. Quando colocada na face direita, significava que a pessoa era casada, e na esquerda, que a pessoa estava engajada. Colocar no canto do olho, sugeria que a pessoa era amante de alguém.

As formas e significados ligados aos remendos, tornavam-se cada vez mais complexas, conforme descrito na seguinte passagem, que menciona manchas em formas de um cocheiro e cavalos.

Pedlar“E ainda assim, as figuras tão emblemáticas são,
Que ela quer deleitar-se em usar.
O cocheiro e cavalo, com rodas apressadas,
Mostra tanto sua mente leviana, quanto saltos incansáveis;
A Cruz e a Cruzeta em uma face combinadas,
Demonstram os transversais humores de sua mente;
O sutiã de das tigelas acaso podemos ver,
Eles jogarão a partida decisiva, a amante;
Os anéis fazem neles, uma exposição negra de arte,
Que os espíritos em seus círculos levantam e estabelecem;
Mas, oh! As estrelas negras sabem que você condena,
Passando a noite, e falando do céu escuro.
As várias luas que em seus rostos variam,
O orgulhoso eclipse de Proteus em suas várias mudanças;
A longa e curta clareira,
O longo corte, pouco nota as cicatrizes,
Suas escaramuças ganharam nas guerras de Cupido.
Para aquelas, que as manchas prendem a Coroa,
“É hora de terminar com tal orgulho e traição.” – Poema ‘On painted and spotted faces,’ de – A wonder of wonders: or, A metamorphosis of fair faces voluntarily transformed into foul visages; de R Smith, 1662.

Existe outra rima, feita por vendedores ambulantes do século XVII, a fim de venderem suas manchas de beleza:

“Seus remendos são de todos os tamanhos, para cicatrizes e espinhas,
Aqui, com todos os signos dos plantes errantes,
E algumas das estrelas fixas.
Já engomado para fazê-los ficar,
Eles não precisam de nenhum outro céu
Nem estrelas, por Lilly para visualizar a dizer suas sortes.
Vamos rapazes e moças, o que lhes falta,
Aqui está, usem de todos os preços,
Aqui, o grande e o pequeno;
Aqui está o grande e reto
Aqui, temos de todos os tamanhos.” – Bolsa da Reforma, 1658

Elizabeth, esposa de Samuel Pepys, usava-os, e em 22 de novembro de 1660, ele declarou-lhe a mais bonita a usá-los e agora ainda mais linda que a princesa Henrietta (filha do rei Charles I). Durante o reinado da rainha Anne (1702-1714), o uso destes remendos chegavam a demonstrar lealdade política; Whigs usava manchas na face direita, e Tories usava-os no lado esquerdo, e aqueles que eram politicamente neutros usavam-os em ambas as faces.

O uso das manchas de beleza, que substituiriam o ceruse usado durante o final do século XVI e início do XVII, continuou a ser utilizado até o século XIX, tanto por ricos, como por pobres.

Final:
Foi apenas à partir do reinado da Rainha Vitória (ainda no século XIX), que a acne seria vista com outros olhos. Desde o início boucher_patchesdos tempos, as pessoas tentavam resolver este problema, mas não havia mal em mascará-lo se isto fosse agradável a pessoa.  Porém, a era vitoriana, trouxe consigo uma novo conceito, de que o desejável era um rosto natural, limpo e portanto, o foco mudou de esconder as manchas, para apenas curá-las. Podemos concluir, que a acne é um problema que afetou e afeta muitas pessoas ao longo da história. Lidar com ela, requer muito mais que bons cosméticos e remédios, como também, uma boa alimentação, costumes e cuidados.

Temos aqui, um tratamento do século 19 para a remoção de espinhas;

Uma onça de água sulfúrica,
1/4 de acetato de amônia,
1gr de potássio,
2 onças de Vinagre de vinho branco,
2 onças de água destilada.
Aplicar 2x ao dia* (não faça isto, é apenas um exemplo).

FONTES:
JPAD: AQUI.
The AWL: AQUI.
Elizabethan Costume: AQUI.
Fragrance X: AQUI.
Classic Beauty: The History of Makeup – 28 de Setembro de 2011; Hernandez, Gabriela.

 

3 comentários Adicione o seu

  1. Helena Gouveia disse:

    Sensacional! Adorei! Eu sabia que as pessoas daquela epoca tinha espinhas xD se naquela epoca era tudo sujo e tomavam poucos banhos (plebe, pq sei qe os Tudors tomavam diariamente) como que nao teriam espinhas!? XD Jesus, como eles escondiam tudo em pinturas, né? Fiquei muito feliz que vc fez este post, irei comentar com meus amigos essa curiosidade :). Continua com o excelente blog. E sempre pondo as fontes, faz os posts mais confiaveis!

    Abcs!

  2. Helena Gouveia disse:

    Ah, fica a dica também: você poderia falar sobre qual é o corpo ideal naquela época, se preferiam mulheres mais cheinhas, magrelas, peitudas (hahaha), etc..Veio na cabeça agora 🙂

    1. Tudor Brasil disse:

      É uma boa ideia. Falamos previamente sobre o assunto, mas não nos estendemos ao corpo, apenas aos traços físicos, como cabelos, olhos, cor de pele e etc. Anotado! 🙂

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