Em 22 de agosto 1485, dois exércitos enfrentaram-se em uma batalha que mudou o curso da história inglesa.
Um grande exército Real, liderado pelo Rei Ricardo III, aguardava a aproximação de um exército rebelde duas vezes menor, liderado por Henrique Tudor, Conde de Richmond. Esta batalha decisiva iria testemunhar a morte de um rei e o nascimento de uma dinastia que prolongaria-se por 122 anos.

Ricardo III governava o país há pouco mais de dois anos, quando encontrou o seu direito ao trono desafiado por Henrique Tudor. Henrique, por sua vez, que começou aquele dia como um rebelde exilado, terminou sendo coroado Henrique VII da Inglaterra.
Henrique havia sido exilado na França desde os 14 anos, mas aos 28 anos ele foi incentivado por sua família Lancasteriana e aliados, a lutar pela chance de se tornar rei da Inglaterra. Ele partiu para Milford Haven no País de Gales com um pequeno exército de exilados ingleses e mercenários franceses.
Henrique pediu a ajuda de Lorde Thomas Stanley e de seu irmão, Sir William Stanley, com base no Noroeste da Inglaterra. Lorde Thomas era casado com a mãe de Henrique, e o mais o mais importante: era um homem rico, e por esse motivo, poderia comandar um grande exército privado. Alguns relatos sugerem que Henrique e Sir William se comunicaram durante a marcha, uma vez que ambos teriam seguido um trajeto semelhante. No entanto, não se sabe se Henrique foi bem-sucedido na busca pelo apoio de Lorde Thomas antes do conflito.

Enquanto isso, Ricardo III, ao saber sobre o desembarque de Henrique, enviou uma intimação para os seus apoiantes, pedindo-lhes para se juntassem a ele equipados para a guerra. Ele também queria o apoio de Lorde Thomas e tomou o seu filho mais velho como refém em uma tentativa de garantir isso.
Ricardo saiu de Leicester com cerca de 12.000* homens, com a intenção de parar Henrique durante sua marcha em direção a Londres. A localização exata de onde eles se encontraram foi, até recentemente, o assunto de muito debate, e pesquisas ainda estão sendo feitas na área ao redor das aldeias ligadas à Batalha.
O exército do rei acampou em Ambion durante a noite, mas na manhã da batalha eles parecem ter se mudado alguma forma, descendo a colina para enfrentar o exército de Henrique Tudor. Os homens de Henrique encontraram um pântano e o cercaram para enfrentar Ricardo. A essa altura os irmãos Stanley, Lorde Thomas e Sir William, já haviam chegado, porém também estava claro que eles ainda não tinham decidido qual dos lados iriam apoiar. Eles passaram a maior parte da manhã assistindo o desenrolar dos acontecimentos.
A Batalha:

Ao contrário de Ricardo – que era um renomado guerreiro-, Henrique nunca tinha lutado em uma batalha antes e sabia que lhe faltava a experiência para enfrentar Ricardo, mas ele contava com o Conde de Oxford, que era um soldado experiente junto com ele. Dessa forma, Henrique assumiu o comando da reserva. Os homens de Oxford se moveram em torno do pântano para atacar o flanco direito de Ricardo, que era comandado por John Howard, o Duque de Norfolk. Ricardo desejava que Norfolk atacasse os homens de Henrique, uma vez que estes tinham atravessado o pântano. Um escritor da Borgonha, Jean Molinet, nos diz que o exército de Oxford (incluindo os mercenários franceses) mudou-se para atacar o flanco de Ricardo e para evitar o fogo pesado da artilharia do Rei. Oxford havia colocado duas bandeiras no chão e incentivou seus homens a formarem-se entre elas. Ele também sabia que eles estavam em desvantagem numérica, e deste modo, ele ordenou que seus homens ficassem a dez passos dos estandartes, garantindo que sua força não seria desfeita. Isto criou uma cunha sólida de homens e quando Norfolk chegou até lá, ele encontrou a defesa de Oxford difícil de atacar. Norfolk foi morto durante a luta feroz, no entanto, a vantagem de números ainda estava com Ricardo e os Yorkistas.

Os homens de Henrique eventualmente avançaram em ordem de batalha. Ricardo, do seu ponto de vista, viu que estava perdendo Norfolk no flanco direito e que Northumberland não se envolveu, ou não poderia se envolver com qualquer inimigo, pois ele afirmou que sua tropa precisava permanecer em posição para enfrentar qualquer movimento dos Stanley. Nesse momento, Ricardo ordenou que Lord Stanley entrasse em combate imediatamente, e deixou a instrução para execução de seu filho, caso ele não o obedecesse. Essa ordem, por sua vez, também não foi obedecida, e os carrascos, talvez por prudência, esperaram para ver quem venceria o combate antes de se tornarem responsáveis pela morte do filho de um nobre potencialmente vitorioso.
Ao perceber como a abordagem Henrique contava com uma relativamente pequena força de homens, Ricardo pode ver uma chance de ganhar a batalha de forma definitiva matando Henrique.
O ataque de Ricardo foi vigoroso, e a princípio, bem-sucedido. Ele ficou assustadoramente perto de Henrique Tudor, chegou a conseguir derrubar Sir John Cheney e o porta bandeira Tudor, Sir William Brandon e, segundo algumas fontes, ele e Henrique lutaram diretamente durante algum tempo.

Neste ponto, William Stanley finalmente decidiu manter o compromisso de apoiar Henrique, e seus homens atacaram Ricardo e seus cavaleiros. Ricardo III encontrou-se em menor número e embora consciente de que havia sido derrotado, ou talvez justamente porque soubesse disso, ele se recusou a fugir do campo de batalha. Alguns mencionam que ele rechaçou as tentativas de seus homens de lhe entregarem um cavalo para a fuga, alegando que pretendia morrer como Rei da Inglaterra. Pode ter sido uma teimosia incrível, pura coragem, desespero heroico por ter sido traído, ou percepção de que fugir significava ser humilhado e executado em algum momento no futuro; não temos como saber, mas qualquer que fosse a razão, ele manteve sua posição, foi ferido e lutou até a morte. Os detalhes são vagos sobre como Ricardo chegou ao seu violente e sangrento fim, mas parece que ele foi desmontado e arrastado pelos guarda-costas de Henrique. Pelos danos no crânio de Ricardo, é possível especular que seu elmo foi retirado por trás, o que deixou a cicatriz no queixo, que pode ter sido cortada com um punhal ou instrumento similar. Um ferimento na bochecha sugere também uma ação de esfaqueamento pelas costas durante a batalha. Finalmente, um ataque de uma espada ou arma de batalha, através da cabeça, concluiu a morte do último rei da Casa de York.

A batalha toda durou aproximadamente duas horas e terminou ao meio-dia. Ricardo seria o primeiro rei Inglês a ser morto no campo de batalha desde que Ricardo I, em 1199, e também o último Rei inglês a morrer desta forma. Mais tarde naquele dia, a coroa de Ricardo foi recuperada e Henrique foi coroado em um campo nas proximidades Crown Hill em Stoke Golding.
O corpo de Ricardo foi colocado ao ar livre por dois ou três dias, para que as pessoas pudessem ver e assim confirmar a sua morte, bem como a vitória de Henrique em Bosworth. Ricardo foi, então, colocado para descansar no Mosteiro Greyfriars.
Henrique VII, o novo rei da Inglaterra se casou com a sobrinha de Ricardo III, Elizabeth de York, juntando as casas de York e Lancaster. Porém, como sabemos, apesar desta união, as revoltas Yorkistas continuaram até 1499.
Algumas observações e curiosidades sobre Bosworth Field:
1) A batalha de Bosworth não foi realmente travada em Bosworth.
Ela só se tornou conhecida como “A batalha de Bosworth” cerca de 25 anos após ter ocorrido. Em vez disso, seus contemporâneos a conheciam como a batalha de “Redemore”, que significa lugar de juncos. Outros nomes para a batalha eram “Brownheath” e “Sandeford”.
2) Pode ser difícil imaginar o tamanho da batalha.
As estimativas apontam que o exército de Ricardo III tinha cerca de 15.000 homens – aproximadamente três vezes o tamanho do exército de Henrique Tudor, com apenas 5.000 homens. Enquanto isso, os irmãos Stanley tinham cerca de 6.000 homens entre eles. Estes números significam que o local da batalha deve ter sido bem amplo.
3) Ricardo tinha um impressionante arsenal militar.
Um relato menciona 140 canhões, enquanto as pesquisas arqueológicas do campo de batalha encontraram mais de 30 balas de canhão – mais do que qualquer outra descoberta em um campo de batalha medieval europeu.
4) Henrique Tudor tinha chegado ao País de Gales no dia 7 de agosto e tinha marchado mais de 200 milhas na Inglaterra.
Ricardo III tinha ficado “muito feliz” ao ouvir sobre seu desembarque e estava confiante de que ele iria derrotar o rebelde. De fato, ele estava tão confiante que chegou a se atrasar, deixando sua base em Nottingham por um dia, a fim de celebrar um dia de festa.
5) Sendo ele um novato no que se tratava de batalhas, Henrique Tudor permaneceu na parte de trás do campo, enquanto suas forças foram lideradas pelo general Lancasteriano, John de Vere, Conde de Oxford, que também liderou a vanguarda de Henrique.
Conforme mencionado acima, entre as duas forças havia um pântano que Oxford conseguiu circular, antes de lançar um ataque contra a vanguarda de Ricardo III, que era comandada pelo Duque de Norfolk.
6) Foi com o esmagamento da vanguarda de Ricardo por Oxford, que a batalha começou a virar para Henrique: as tropas de Ricardo começaram a abandoná-lo.
Em particular, a sua retaguarda de 7.000 homens foi liderada por Henrique Percy, o Conde de Northumberland. Relatos mencionam que ela se deteve, e “nenhum golpe foi dado ou recebido”, sugerindo que os homens de Northumberland foram mantidos fora da ação. Talvez eles não tenham sido capazes de atravessar o pântano.
Alternativamente, contos da traição de Northumberland foram abundantes. Mais tarde, ele foi morto por seus próprios partidários por ‘decepcionar Ricardo’. Seja qual for a causa, o fato é que metade da retaguarda do exército de Ricardo não se envolveu na batalha e isso deixou o rei com sérios problemas.
7) Ofereceram a Ricardo um cavalo para que ele pudesse fugir da batalha, mas ele recusou.
Os relatos mencionam que ele teria dito: “Deus me livre de dar um passo. Neste dia eu vou morrer como um rei, ou vencer”.
8) A batalha foi brutal.
Todas os relatos atestam a força de Ricardo em batalha. Mesmo John Rous, que comparou Ricardo ao Anticristo, admitiu que “se me permite dizer a verdade, a seu crédito – embora pequeno de corpo e débil de membros – ele portou-se como um cavaleiro galante e agiu com distinção como seu próprio campeão até seu último suspiro”.
Ricardo derrubou Sir John Cheyney, que foi o soldado mais alto na época, com certa de 2,07 metros. Ele também conseguiu matar o porta-estandarte de Henrique, Sir William Brandon. O próprio porta-estandarte de Ricardo, Sir Percival Thribald, teve as duas pernas cortadas durante a batalha, mas ainda conseguiu agarrar-se ao estandarte Real.
9) Foi só quando Henrique ficou em ‘perigo imediato’ que os Stanley – ou melhor, Sir William Stanley – veio em seu auxílio, colidindo com o flanco dos homens de Ricardo e varrendo-os para o pântano.
Sir William não ganharia se Ricardo tivesse vencido – ele já havia sido declarado traidor dias antes. Seu astuto irmão mais velho, Thomas Stanley, apesar de ser casado com a mãe de Henrique Tudor, Margaret Beaufort, parece ter pensado melhor e preferido ficar fora da batalha por completo. Quando Henrique foi coroado após o conflito, uma das fontes relatou que foi Sir William Stanley, em vez de seu irmão, quem colocou a coroa na cabeça do novo rei.
10) Graças à descoberta dos restos de Ricardo, agora sabemos mais detalhes sobre como Ricardo deve ter encontrado seu fim.
Um relatório sugere que sua morte foi causada por um alabardeiro galês – a alabarda era uma arma semelhante a um machado, porém com um cabo mais logo. O capacete do rei parece ter sido cortado – existem marcas de corte na mandíbula do crânio sugerindo que a alça do capacete foi cortada – para expor a cabeça.
Várias marcas na parte frontal do crânio parecem ter sido causadas por um punhal, talvez em uma luta. Em seguida, as duas feridas que teriam matado Ricardo, incluem um corte na parte de trás da cabeça que e expôs o cérebro e parece ter sido causado por uma alabarda, e se isso não o matou, a lâmina de uma espada que foi impulsionada da base do crânio em linha reta através do cérebro certamente deve ter concluído o trabalho.
O corpo de Ricardo foi então colocado na parte de trás de um cavalo, amarrado como um porco, com suas “partes íntimas” expostas e levado para Leicester, onde seu foi colocado em exposição pública.
Em conclusão, Bosworth continua a ser uma batalha com um apelo duradouro: não é simplesmente um conto sobre uma derrota e uma vitória, mas também sobre intriga e traição.
Fontes:
DOUGHERTY, Martin J.“Guerra das Rosas”. A história que inspirou Game of Thrones. São Paulo: M.BOOKS, 19 nov 2015.
R3.org: AQUI.
Bosworth Battle Field: AQUI.
Battlefield Trust: AQUI.
Henrique Tudor Society: AQUI.
History Extra: AQUI.
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