Henrique Tudor nasceu durante um dos períodos mais traumáticos da história inglesa, uma época em que as facções armadas de Lancaster e York estavam entrando em guerra civil em meio as pragas assolavam o sul do país. Naquele momento, a Inglaterra era um reino mutante de duas cabeças.
Henrique era filho de Edmund Tudor, o meio-irmão do rei, e da jovem Margaret Beaufort. O casamento de seus pais foi uma aliança política formada pelo rei Henrique VI, na esperança de aumentar o prestígio e a fortuna de seu irmão. O casamento por si só não foi incomum, embora a diferença de idade entre os cônjuges fosse grande – na época Edmund contava com 24 anos, e Margaret, com 12. No entanto, o que realmente chocou a sociedade da época, foi o fato de o casamento ter sido consumado. Embora o matrimônio fosse legal, e Margaret já tivesse idade o suficiente para desposar um homem, ela era fisicamente pequena e subdesenvolvida e, na visão de seus contemporâneos, não estava pronta para consumar seu matrimônio. Porém, Edmund pensava diferente. Ele sabia que ter um filho com Margaret, garantiria a ele o pleno direito sobre sua fortuna e propriedades. E mesmo causando indignação entre seus contemporâneos, ele imediatamente consumou o enlace, e Margaret engravidou durante a primeira metade de 1456.
Apesar de tudo isso, Edmund Tudor não estava destinado a conhecer seu filho. Em 10 de agosto de 1456, ele foi capturado e aprisionado no castelo de Camarthen por William Herbert, um aliado do Duque de York. Ele foi libertado logo depois, mas morreu em 1 de novembro, após contrair a praga. Margaret tinha apenas treze anos no momento da morte prematura do marido e estava grávida. Ela também tinha consciência de que, em virtude de sua relação com a Dinastia de Lancaster, era uma figura de importância na guerra, e temendo por sua própria vida e pela de seu filho, ela buscou imediatamente a proteção de seu cunhado, Jasper Tudor, no Castelo de Pembroke, enquanto esperava o nascimento do bebê.
De acordo com a tradição, Margaret foi alojada em uma câmara na ala exterior do castelo, e foi lá que, em 28 de janeiro de 1457, ela deu à luz seu primeiro e único filho. Henrique nasceu mais de três meses após a morte de seu pai, e o parto, que já era arriscado em circunstâncias normais, foi ainda mais perigoso dado a idade e a estrutura física da mãe. O trabalho de parto foi longo e difícil, e esperava-se que tanto a mãe quanto a criança morressem em decorrência dele. A imaturidade física da mãe foi grande parte do problema, e como o Confessor de Margaret, John Fisher, escreveria mais tarde: “Parecia um milagre que alguém pudesse nascer de uma pessoa tão pequena. ”
É comumente aceito que o processo do parto danificou o corpo de Margaret, já que não há registro de que ela tenha concebido outra criança, e esse fator é atribuído à sua juventude na época do nascimento de Henrique VII.
Mãe e filho continuaram a viver na residência de Jasper Tudor. Jasper procurou influenciar as decisões de Margaret sobre seu filho, e foi durante o batismo que a jovem demonstrou sua força de vontade pela primeira vez. O cronista galês do século XVI, Elis Gruffydd, alegou que, em seu batismo, o filho de Margaret foi nomeado Owen, uma escolha feita por Jasper, como uma homenagem a seu pai e avô do garoto, Owen Tudor, que ainda estava vivo. E Margaret, ao ouvir sobre a escolha do nome no batismo, ordenou ao bispo para batizar seu filho novamente, e desta vez com o nome certo: Henrique.
Ao nomear seu filho em homenagem ao Rei, seu tio, – que provavelmente era também seu padrinho -, Margaret assegurou que seu bebê tivesse um protetor poderoso e uniu firmemente sua criança à Família Real.
Após isso, a jovem mãe passou a dedicar sua atenção inteiramente para seu filho, que, de acordo com seu biógrafo contemporâneo, Bernard André, era uma criança delicada. Henrique Tudor possuía uma forte semelhança física com sua mãe, sendo de uma constituição pequena, e olhos penetrantes emoldurados por uma face longa e fina. Durante esses primeiros meses, mãe e filho raramente estavam separados, pois Margaret acreditava que sua presença daria força a sua criança. Embora Margaret estivesse constantemente ciente dos perigos da situação política na Inglaterra, em Pembroke, ela sentia-se protegida de tudo o que estava acontecendo, e passava todo seu tempo com seu filho. É possível afirmar que, o ano após seu nascimento, pode ter sido um dos mais pacíficos da vida de Henrique Tudor.
Logo após esse primeiro ano, Margaret casou-se de novo, e, seguindo a Lei medieval, ela teve de abdicar da guarda de seu filho e deixá-lo sob os cuidados de seu parente mais próximo, no caso, Jasper Tudor. Nos primeiros quatro anos de sua vida, Henrique foi criado por seu tio em Pembroke, local onde o jovem desenvolveu-se bem e mostrou-se extraordinariamente rápido e brilhante. Ele também recebia visitas frequentes de sua mãe e de seu padrasto e parecem ter sido anos tranquilos, mas essa calmaria prestes a chegar ao fim.
Em 1460, o jovem Eduardo IV venceu a sangrenta batalha de Towton e depôs o rei Henrique VI, assumindo o trono da Inglaterra. Para os Beaufort e os Tudor, a derrota em Towton foi um desastre. A criança em quem suas famílias se apoiavam, o pequeno Henrique, de apenas quatro anos de idade tornou-se um valioso prêmio, pois era herdeiro de sua mãe e herdeiro potencial das terras confiscadas de seu pai, e assim, uma criança particularmente preciosa.
Em 1466, Eduardo IV dividiu as suas terras entre os vencedores, e ofereceu a guarda de Henrique a Lorde William Herbert, que o levou para ser criado entre as crianças do Castelo de Raglan, em Gales do Sul. O título de Henrique, Conde de Richmond, também foi confiscado e concedido ao irmão do novo Rei, George, Duque de Clarence. Henrique diria mais tarde ao cronista Philip de Comines que “Desde os cinco anos tinha sido sempre um fugitivo ou um prisioneiro. ”, e isso certamente se referia à sua captura por Lorde Herbert.
A educação do menino foi confiada por Herbert à sua esposa, Anne Devereux, que o tratou como um membro da família, e Henrique foi criado de forma digna como um jovem nobre. Fica claro a partir da própria conduta posterior de Henrique que ele não guardou rancor contra seu carcereiro, e após tornar-se rei em 1485, Anne Devereux correu ao seu encontro. O encontro parece ter indicado que ele tinha algumas boas lembranças de seu tempo com os Herberts, apesar de sua afirmação posterior de que era um prisioneiro. William Herbert e sua esposa também tinham outra razão para investir na educação de Henrique, afinal, eles tinham muitas filhas solteiras. Em seu testamento, escrito em 1468, Herbert declarou: “Eu quero que Maud, minha filha, seja casada com o Lorde Henrique de Richmond. ” Como um futuro genro, Herbert estava interessado em assegurar que Henrique fosse bem-criado. Henrique foi bem educado, e há evidências de que Lorde Herbert contratou dois graduados de Oxford, Edward Haseley e Andrew Scot, para este propósito, sugerindo mais uma vez que seu “aprisionamento” não era tão rigoroso. Além disso, ele tinha permissão para receber visitas de sua mãe e padrasto e de escrever para eles. Mas esses planos falharam e foram alterados em 1468, quando Richard Neville, Conde de Warwick, mudou de lado e decidiu depor Eduardo VI, ou no mínimo, forçá-lo a dar o controle do reino para ele.

No verão daquele ano, Henrique Tudor contava com doze anos de idade e foi considerado por seu guardião, suficientemente velho para sentir seu primeiro gosto da guerra. Herbert juntou-se a Eduardo IV na Batalha de Edgecote, perto de Banbury, em 26 de julho de 1469, onde as forças do jovem rei foram decisivamente derrotadas. Henrique, sobreviveu ao meio de batalha, mas William Herbert foi capturado e sumariamente executado. A derrota e a morte de seu tutor colocaram o filho de Margaret em uma posição muito perigosa, e ele foi resgatado por Sir Richard Corbet, um parente da esposa de Herbert. O jovem Henrique evidentemente causou uma excelente impressão em Corbet, pois está registrado que, quando Henrique voltou à Inglaterra em 1485, para reivindicar a coroa, Corbet foi um dos primeiros a se juntar a ele e prometer-lhe seu apoio. Henrique foi levado primeiro para a casa do cunhado de Herbert, em Weobley, Herefordshire, para onde a viúva de Lorde Herbert também foi quando soube do resultado da batalha.
Com a morte de William Herbert, a mãe de Henrique, Margaret Beaufort, esperava recuperar a custódia de seu filho e garantir o retorno de suas terras e título. Em agosto de 1469, ela resolveu agir e viajou com seu marido para Londres, na esperança de negociar com o Duque de Clarence – que havia ganhado o título e as terras de Henrique de seu irmão, e era naquele momento um dos homens de autoridade na Inglaterra. No entanto, essa ação se provou infrutífera. Além disso, o jogo político estava mudando outra vez, pois Warwick e Clarence não conseguiram manter o controle do reino, e acabaram fugindo para a França.
Em 1470, Warwick fez outra investida contra o trono, dessa vez apoiando o velho rei Henrique e sua esposa, Margaret de Anjou. Ele foi bem-sucedido em sua invasão, fazendo com que Eduardo IV tivesse que fugir, abandonando sua esposa e filhas. Warwick rapidamente se assegurou de colocar Henrique VI de volta no trono, fazendo então com que a vida de Henrique Tudor sofresse outra mudança.

Ao ouvir sobre o retorno de Jasper Tudor ao País de Gales, Sir Richard Corbet, permaneceu perto de Weobley, onde a tia de sua esposa estava hospedada com Henrique Tudor. Ele levou o menino para Hereford e entregou-o ao seu tio. Esta foi a primeira vez que Jasper e Henrique se encontraram desde 1461, e foi o começo de uma longa aliança entre ambos. E em 28 de outubro, Jasper e o padrasto de Henrique, Stafford, jantaram juntos na Casa de Stafford em Londres. A reunião foi um sucesso, e Jasper temporariamente entregou a custódia de seu sobrinho à mãe, e Henrique foi levado por Margaret para encontrar-se com o Rei.
Ele recebeu de volta seu título de Conde de Richmond e foi uma das primeiras pessoas a serem recebidas pelo rei em sua cerimônia de restauração ao trono. A ocasião da apresentação do jovem Henrique ao Rei, seu tio, tem sido frequentemente repetida, embora provavelmente seja um relato apócrifo, como uma profecia sobre o futuro do menino, dado que aparentemente, Henrique VI teria dito: “Seus olhares são cheios de majestade calma. Sua cabeça foi por natureza moldada para usar uma coroa, sua mão é de empunhar um cetro, e ele próprio provavelmente irá abençoar um trono real no tempo certo. ” E também “Este é ele, a quem tanto nós quanto nossos adversários devemos temer. ” E de acordo com Bernard Andre, o rei também aconselhou que o menino fosse enviado para o exterior para escapar da malícia de seus inimigos.
É muito improvável que, em 1470, com ele e seu filho ainda vivos, Henrique VI teria previsto que Henrique Tudor um dia usaria a coroa. É mais provável que a “profecia” de Henrique VI seja uma criação posterior da reunião, mas apesar disso, Margaret e seu filho recordaram mais tarde a Vergil, que a reunião foi um sucesso e que Henrique VI mostrou muita afeição e honra ao filho de seu falecido meio-irmão.
Após a reunião bem-sucedida com o Rei, Margaret, Henry Stafford e Henrique Tudor viajaram para Woking. Henrique e sua mãe passaram uma semana juntos em sua residência, e parece que usaram esses dias como uma oportunidade de novamente conhecer um ao outro.

Em 1471, Henrique Tudor estava se aproximando rapidamente da idade adulta; já era mais velho do que sua mãe quando deu à luz a ele. E a custódia de Henrique foi entregue mais uma vez ao seu tio, pois era hora de o garoto começar a trilhar seu caminho no mundo e este homem havia mostrado interesse em oferecer-lhe tal educação. Infelizmente, esse curto período de tranquilidade estava chegando ao fim, e pouco tempo depois, ocorreu a derrota dos Lancasters na batalha de Tewkesbury, seguido das mortes do príncipe de Gales e do Rei Henrique VI, que fizeram com que a causa Lancasteriana parecesse impossível, fazendo com que nem mesmo o País de Gales fosse seguro para Henrique Tudor.
E foi assim que Jasper, a pedido da mãe do menino, embarcou com o seu sobrinho em um navio com destino à França. Porém, o navio deixou seu curso por causa das tempestades, e os fugitivos acabaram desembarcando na costa da Bretanha, que era então governada pelo Duque Francis. Ele os recebeu com hospitalidade, sugerindo que possuía em suas mãos um meio possível de comprar uma aliança da Inglaterra contra o seu ameaçador vizinho, a França. Bernard Andre, no entanto, sugere que o Duque foi induzido a ajudar o rapaz com base em sua aparência e “boas qualidades evidentes”, o que, francamente, não é muito provável. No entanto, o Duque certamente manteve sua promessa de proteção, e Henrique permaneceu em segurança na Bretanha, apesar dos incansáveis esforços de Eduardo IV para que ele fosse entregue. Aparentemente, Henrique estava seguro, mas sua curta experiência de vida já o havia ensinado que a segurança era um bem deveras passageiro.
Continua…
Fontes:
Penn, Thomas – “Winter King: The Dawn of Tudor England”.
Gristwood, Sarah – “Blood Sisters: The Women Behind the Wars of the Roses”.
Norton, Elizabeth – “Margaret Beaufort: Mother of the Tudor Dynasty”.
Temperley, Gladys – “Henry VII”.
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