Os Romanov – Pedro, o Grande [Parte I]

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Primeiros Anos e Infância:

Em março de 1669, quando o czar Alexei tinha quarenta anos de idade, sua primeira consorte, a czarina Maria Miloslavskaia, morreu enquanto exercia sua função dinástica essencial, a de dar à luz um herdeiro. Durante os 21 anos em que esteve casada com Alexei, Maria havia mostrado-se fecunda, uma vez que já havia gerado 13 crianças. Entretanto, na altura de sua morte, apenas dois filhos homens do primeiro matrimônio de Alexei, seguiam vivos, Teodoro e Ivan, ambos, contando com uma saúde frágil.

Estava entendido que, caso o czar elegesse uma nova czarina, tal escolha seria voltada a uma filha da nobreza russa ortodoxa, e não à alguma princesa estrangeira, uma vez que tal prática era desprezada e evitada. Tal pensamento, ajudou a isolar a Rússia do cenário de alianças com nações estrangeiras, surtindo como efeito, a ganância e cobiça entre as famílias nobres do czarado russo, que tinham entre suas filhas, a possível futura czarina.

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Alexei da Rússia, pai de Pedro, o Grande.

Menos de um ano após a morte de Maria, Alexei já havia encontrado a sucessora de sua consorte. Deprimido e solitário, ele com frequência passava as noites na casa de seu ministro-chefe e amigo íntimo, Artemon Matveiev, um homem fascinado pela cultura ocidental, e portanto, incomum para a Moscóvia do século XVII. Foi durante uma dessas noites, que os olhos do czar pousaram na jovem Natália Naryshkina, que na época contava com 19 anos de idade. Era uma mulher alta, com curvas definidas, e olhos negros adornados por longos cílios. Sem delongas, o czar ordenou que, em fevereiro de 1670, ocorresse a cerimônia de inspeção. Tal evento consistia na reunião de mulheres de diversos patamares da nobreza, com idade o suficiente para o matrimônio. Elas seriam analisadas pelo czar em pessoa, e então, escolhidas pelo mesmo. Natália Naryshkina obviamente, estava entre as convidadas.

Após uma série de inspeções, a escolha foi por fim, confirmada. Em fevereiro de 1671, para o desgosto dos Miloslavsky – que consequentemente perderiam altos cargos para os Naryshkin – o czar Alexei desposou a jovem Natália. Ela trouxe consigo o frescor, tranquilidade, felicidade e um sentimento de renovação. O deleite do czar por sua esposa cresceu ainda mais, quando, no outono de 1671, recebeu as boas novas de que ela carregava um filho.

Em 30 de maio de 1672, à uma hora da manhã, Natália deu à luz um robusto e saudável menino, de quase meio metro de altura. Ele recebeu o nome de Pedro Alexeievich Romanov, em homenagem ao apóstolo. Inteligente, ativo, e barulhento, Pedro cresceu rapidamente. A maioria das crianças começam a andar por volta de um ano de idade, mas Pedro já dava seus primeiros passos aos sete meses.

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Natália Naryshkina, mãe de Pedro, o Grande.

O forte menino foi crescendo com saúde. Seu pai gostava de levá-lo consigo em excursões ao redor da Moscou. No entanto, de forma repentina, quando tinha três anos de idade, no início de 1676, o czar Alexei faleceu de um forte resfriado. Privados de seu poderoso defensor e com seus demais apoiadores afastados do governo, Natália e seus dois filhos desapareceram da vida pública.

O novo czar da Rússia, era agora o adoentado meio-irmão mais velho de Pedro, Teodoro, que tornou-se Teodoro III. Logo, deu-se início a educação de Pedro. Nikita Zotov, um eclesiástico, foi selecionado para ser o tutor do czarevich. A tarefa de Zotov consistia apenas em ensinar Pedro a ler e escrever, mas ele logo encontrou seu pupilo ansioso para ir além. Um grande globo terrestre enviado da Europa ocidental, era o fascínio do jovem. Nos seis anos de reinado de Teodoro, a vida de Pedro passou sem sobressaltos. Embora quase sempre enfermo, Teodoro realizou uma grande reforma: a abolição do sistema medieval de precedência, um peso massivo na administração pública, que decretava que os nobres só podiam aceitar cargos na administração pública ou militar de acordo com sua posição. Teodoro faleceu sem herdeiros. Os dois candidatos vivos eram o irmão de dezesseis anos do falecido czar, Ivan, e o meio-irmão de dez anos, Pedro. Em condições normais, Ivan teria sido escolhido, sem contestações. No entanto, ele era quase cego, coxo, e falava com dificuldade, ao passo que Pedro era ativo, inteligente e cheio de energia.
A escolha entre os dois deveria ter sido feita por uma “Zemski Sobor”, uma assembléia popular. Entretanto, uma reunião de tal magnitude, levaria semanas. Naquele momento, Pedro e Ivan foram apresentados ao povo nas portas do palácio. Pedro foi o eleito.

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Retrato de Pedro, o Grande, quando criança.

A crise na Rússia havia então chegado ao fim. Natália, sua mãe, governaria como regente, e, mais uma vez, os Naryshkin tomam as rédeas do governo. Entretanto, eles esqueceram da czarevna Sofia, uma irmã de Ivan. O Terem, onde mulheres da classe alta da sociedade moscovita eram confinadas, isoladas do mundo, como em um harém turco, deveria ter sido o mundo de Sofia. Entretanto, ainda criança, ela havia participado de aulas com o irmão mais velho, e tinha um agudo tato político. A morte de Teodoro III, a queda de influência de sua família, e a súbita entrega do poder a Pedro, foram duros golpes para a czarevna.

A tensão entre as duas famílias culminou quando, em 15 de maio de 1682, membros do círculo familiar dos Miloslavsky, fizeram correr o boato de que os Naryshkin haviam assassinado o czarevich Ivan. Os Streltsi, lanceiros e mosqueteiros barbados que guardavam o Kremlin, explodiram em euforia em seu alojamento, e começaram a avançar pelas ruas em direção ao palácio a fim de punir os supostos regicidas. Amontoados diante da Escada Vermelha – que levava da praça ao palácio – os Streltsi exigiam sangue e vingança, entoando o discurso de “entreguem-nos os Naryshkin e os demais traidores!”. Diante de um ato de coragem e desespero, a czarina Natália foi ao encontro do regimento juntamente com Pedro e Ivã. Diante da farsa evidente, vários ficaram atordoados. Entretanto, alguns não perderam a oportunidade de assassinar boiardos (aristocratas russos) odiados. Em questão de minutos, os Streltsi invadiram o palácio, arrastaram vários boiardos de seus aposentos, e os fizeram em pedaços, inclusive um irmão da czarina.
Agora não havia mais oposição. Uma das exigências dos Streltsi era que Ivã fosse entronizado czar juntamente ao lado de Pedro, sob a regência da czarevna Sofia. E assim foi feito. Enquanto Sofia governava, Pedro deixou Moscou, indo crescer no interior, fora da cidade, apenas exercendo funções cerimoniais.

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Sofia, Czarevna da Rússia.

Tal revolta marcou Pedro para toda a vida. A calma e a segurança de sua infância foram estilhaçadas, sua alma, torcida e causticada. Isso conferiu-lhe certo asco pelo local do ocorrido. Mais tarde, suas aversões tiveram consequências significativas. A antiga capital seria substituída por São Petersburgo, local no Báltico, escolhido por ele. Pedro passou a detestar a pompa e a religiosidade que beiravam o delírio dos antigos moscovitas, os quartos escuros, e labirintos de pequenos aposentos iluminados por chamas de velas no Kremlin, e as mulheres pateticamente isoladas e submissas. O exílio político dos Naryshkin acabou sendo a boa sorte de Pedro. Ele acabou vivendo longe do centro do poder.

Pedro agora, que passava a maior parte do tempo na casa de campo e caça em Preobrajenskoe, no rio Yauza, poderia retomar sua infância; sua brincadeira favorita era a simulação de uma guerra. Até certo ponto, as brincadeiras bélicas de Pedro haviam transformado a casa de veraneio em um acampamento militar para adolescentes. A partir desse conjunto de jovens nobres e plebeus – que também eram permitidos – viria a criar o orgulhoso Regimento Preobrajenski, primeiro regimento da Guarda Imperial Russa, cujo coronel era o czar da Rússia – tal sistema manteria-se até a queda da monarquia, em 1917. O jovem também recusava posições mais altas em qualquer organização militar ou naval. Ele estava disposto a ser promovido quando sentisse sua competência e seus serviços justificassem por mérito tal promoção.

Com a relutância de Sofia em deixar o poder, a maioridade de Ivã já atingida, e a de Pedro que estava por vir, os aliados da regente acabaram por se perguntar da obsolescência da regência. Somando-se a isso, Pedro reivindicava agora o poder para si, e para o meio-irmão, sem a interferência de Sofia. Logo, sem apoio, a mulher que comandara a Rússia por sete anos, veria sua vida mudar drasticamente. Com a ajuda de seus aliados, Pedro – com 17 anos de idade – colocou Sofia no Convento de Novodevichi, local que seria sua morada pelos próximos quinze anos. Entretanto, é necessário ressaltar que, no século que se seguiu, o papel da mulher real na Rússia sofreria uma transformação. Foram quatro soberanas que sucederam Pedro no poder. Com sua determinação e impulso de governar, foi Sofia, portanto, a responsável em abrir caminho para este regime feminino de governantes.

No dia 16 de Outubro de 1689, Pedro, trajando vestes de estado, apresentou-se na Escadaria Vermelha. Pela primeira vez, o jovem alto, de rosto arredondado e olhos escuros ali parado, era o senhor do Estado russo. Uma nova etapa de sua vida iniciava-se. Pedro seria co-czar ao lado de seu meio irmão, até a morte deste, em 1696.

Continua…

Artigo escrito por Daniel Vilela, autor da página Romanov – A Última Dinastia da Rússia. Conheçam!

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